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  • Glaucy Lucas

Dom Afonso Henriques - Um Rei Invicto

O rei que, na sua juventude, começou suas conquistas com alguns amigos e uma faca na boca.

O Rei Dom Afonso Henriques

Afonso Henriques é filho do Conde D. Henrique e D. Tereza. O Conde D. Henrique é o terceiro filho do Duque Henrique de Borgonha, e de Sybilla de Borgonha, e neto de Roberto I, Duque da Borgonha, bisneto de Roberto II, rei de França. Afonso Henriques nasceu em Guimarães em 25 de julho de 1109. Ficou órfão aos três anos, estando ainda aos cuidados de Egas Moniz, amigo e fiel companheiro do Conde D. Henrique, seu pai. O Conde D. Henrique nunca foi católico e a igreja que construiu em Tomar até hoje não tem nenhum santo da religião católica. Os santos que lá estão foram postos pelo rei D. João III, na parte construída por ele. Assim também, Afonso Henriques não era católico e não pôs nenhum santo nas igrejas que construiu, não aceitou imposições de Roma, nem de bispos e padres.


Um menino era considerado criado aos oito anos. Aos sete anos, dizia-se que a criança perdia a inocência; aos oito anos estava criado; aos dez anos era homem. Concluímos que Afonso Henriques voltou para a companhia de sua mãe aos oito anos porque fora dado a Egas Moniz para ser criado. Este Egas Moniz era filho do Conde Monio Ermiges de Ribadouro e de Meana D. Ouroana, descendente de Ermenegildo Guterres, que viveu no ano de 860 ou ano 890; neto de Ermígio Viegas e bisneto de Egas Moniz, o gasco. Fica evidenciado que ele fazia parte da família da Borgonha, pois, seu bisavô era da Gasconha. A amizade entre o Conde D. Henrique e Egas Moniz não nasceu quando o primeiro chegou à Espanha, e com o outro tivesse um encontro casual. Havia ligações familiares, dominiais, e quiçá de sangue, muito antigas procedentes do Condado da Borgonha. Para além da simples amizade, havia um preito de lealdade que tornara o pai de Egas Moniz conde de Ribadouro. Egas Moniz foi fiel ao Conde D. Henrique e ao filho deste, em toda sua casa, sem jamais resvalar para qualquer ato que pudesse por em dúvida a sua honra e a sua lealdade à casa que pertencia. Seus filhos prosseguiram na mesma lealdade para com o rei Afonso Henriques.


A entrega do bebé Afonso Henriques ao amigo Egas Moniz não foi porque tivesse algum problema de saúde. Ele era perfeito e de muito boa saúde. Mas, isto foi feito para que o avô Afonso VI de Espanha não se apoderasse do menino e o tornasse um espanhol como ele, possibilitando uma futura união do Condado ao seu trono. Sua mãe, D. Teresa, pensava como o rei seu pai e trabalhava para que ele fosse como um espanhol. Criado na corte espanhola, Afonso Henriques seria um deles, e D. Henrique perderia seu herdeiro, sua identidade, e sua linhagem deixaria de existir. Como andasse nas guerras, não podia ter o filho consigo e passar a sua essência, sua fé, e modo de sentir e pensar. Era homem muito prudente e sabia que, vivendo o filho com sua mãe, assimilaria toda a cultura espanhola; mas, evitava se indispor com sua mulher e seu sogro. Sem despertar desconfianças, entregou ao amigo Egas Moniz, o filho para que imprimisse na sua alma a fé do seu pai. Assim, subtraiu-o à influência da mãe e, por meio de Egas Moniz, incutiu nele a sua marca. Ao voltar para sua mãe, Afonso Henriques trazia em si a alma do Conde D. Henrique.


Uma vez com sua mãe, o futuro rei começou a dar mostras de que caminho iria seguir. Os primeiros desentendimentos terão sido causados pelo culto católico e os altares com seus santos. Sua pouca idade só lhe permitia uns resmungos e a ausência aos atos religiosos, coisas que pouco incomodavam a sua mãe. Os desentendimentos cresciam à medida que o menino crescia. A presença do Conde de Trava desagradava-o muito porque não recebia dele o tratamento devido à sua honra e dignidade. Com todas estas rusgas, o Conde Afonso Henriques era sempre ignorado nas festas, nos atos oficiais e religiosos, afastado da vida política e social do Condado. Vivia com os amigos e toda a corte que tinha sido fiel ao seu pai. Neste ambiente Afonso Henriques terminou de forjar o seu caráter que era em tudo muito contrário ao de sua mãe.


A Condessa Dona Teresa cercou-se dos seus parentes de Espanha e desdenhava os da Borgonha. Não os expulsava, mas não lhes dava espaço na corte, nem lhes dava o tratamento devido a sua honra e dignidade. Fiéis ao Conde D. Henrique, eles juntaramse ao Conde Afonso Henriques, dividindo o Condado em duas facções que refreavam as suas animosidades sem disfarçá-las. Os de Espanha, confiados nas suas armas e poder de Castela, estavam à espera de uma ordem da Condessa D. Teresa para que os homens da Corte de D. Henrique saíssem dos seus domínios e voltassem para a Borgonha. O Conde de Trava passou a residir no Castelo de Guimarães, provocando veementes protestos do Conde Afonso Henriques. Em resposta aos seus protestos, o Conde tornou-se amante de D. Teresa e assumiu a governança, com o objetivo de unir o Condado Portucalense à Espanha. Mandou prender Afonso Henriques, e D. Teresa não o contradisse nem temeu qualquer reação dos borgonhãos. Os homens da casa do Conde D. Henrique, liderados pelo Arcebispo de Braga, D. Paio Mendes, soltaram-no e o tiraram do Castelo de Guimarães, levando-o para Zamora, no ano de 1120. D. Afonso Henriques foi armado cavaleiro no ano de 1125, na Catedral de Zamora, no dia de pentecostes, portanto, no mês de abril. No decorrer deste período, não se quedou a esperar, mas cuidou de preparar suas tropas para cobrar o Condado que era seu por direito. Este fato não despertou cuidados no Conde de Trava, pois tinha-o por um jovem inexperiente, sem apoio, e com tropas inferiores em número.


Enquanto Afonso Henriques andava nesses aprestos para guerra, sua mãe D. Teresa casou com o Conde de Trava e com ele teve uma filha. O novel casal imediatamente prestou menagem à rainha D. Urraca, e o Conde Afonso Henriques viu que era hora de agir. Nunca houve menagem do Conde Afonso Henriques ao rei Afonso VII de Espanha, seu primo; até porque Urraca reinou até 1220. Egas Moniz nunca prestou menagem ao rei de Espanha em nome de Afonso Henriques, pois no ano de 1140 já se tornara rei de Portugal. Além disso, tal menagem seria alta traição, um atentado à honra do jovem Conde, e Egas Moniz jamais trairia ao filho do Conde D. Henrique, que criara como sendo seu filho; seria fiel a ele como tinha sido ao pai. Ademais, ele não tinha poderes, nem nenhuma ascendência sobre o Conde Afonso Henriques para tomar sua herança, ajudar o Trava a esbulhá-lo dos direitos, e denegrir sua honra sem nenhum pretexto. Na verdade, esse ponto da história é assim explicado: Egas Moniz foi portador de uma carta de Afonso Henriques à Castela, comunicando que, como herdeiro de seu pai, não aceitava sua intervenção no Condado, tomava por inválidos os atos de sua mãe, e não lhe prestaria menagem.


A questão centrava-se na figura do Conde Afonso Henriques. D. Teresa, casada com o Conde de Trava, conferia-lhe o título e autoridade sobre o Condado Portucalense, tornando a filha desta união, a herdeira presuntiva legal. Eram todos espanhóis, todos da mesma casa, portanto, o pensamento era se fortalecerem contra as forças da Borgonha no Condado. Por ser meia irmã de Urraca, e tida como bastarda, a Condessa D. Teresa não tinha forças, e prestar vassalagem a ela ou ao rei seu sobrinho era a opção para manter o seu condado livre de ameaças. As irmãs de Espanha não eram amigas, mas Dona Teresa nunca fez guerra à Urraca. De Afonso VII, nada há para dizer porque só foi rei depois do ano 1220. Dona Teresa participou de uma intensa luta política quando foram celebradas as bodas de Urraca com Afonso I de Aragão. Não há documento que esclareça se atuou em favor do seu sobrinho, mas ressuma das histórias a ideia de que era pelos de Aragão, esperando a recompensa de se ver livre do poder de Urraca, e ainda reaver Toledo. O rei seu pai, Afonso VI, tinha-lhe tirado Toledo anexando-o à coroa de Castela. Como tivesse guerreado o filho, esta hipótese não soa tão estranha. Estas disputas começaram quando o pai de Afonso VII, o Conde Raimundo, morreu em 1107, e o seu filho não foi jurado rei. Mas o filho do rei de Aragão nascido de Urraca ia usurpar-lhe o trono. D. Teresa não se interessava pelo legado de D. Henrique, mas se esforçava por ter o Condado Portucalense e Toledo, herança de sua mãe. Para Urraca, nada podia estar melhor: não havia guerras a fazer contra um seu vassalo, o Conde de Trava, cuja fidelidade demonstrava submetendo o Condado Portucalense à sua majestade. Não há notícia nenhuma de que D. Teresa tenha reagido contra a prisão do seu filho a mando do Conde de Trava. O único insatisfeito era o Conde D. Afonso Henriques porque não foi considerado nem tido por herdeiro de seu pai, mas foi ferido na sua honra e esbulhado dos seus direitos com violência; livrado da morte por milagre. Por outro lado, Afonso VII ainda não tinha provado das lides guerreiras, só o fazendo no reinado de D. Afonso Henriques, que muito o ajudou contra os mouros.


CONSOLIDADO O DOMÍNIO SOBRE O CONDADO


Depois de ser resgatado da prisão pelo Arcebispo D. Paio Mendes, a guerra era inevitável, e se a não fizesse, seria morto. Em 24 de junho de 1128 eclodiu a revolta e os dois exércitos se defrontaram na Batalha de São Mamede, um campo próximo a Guimarães. As poderosas forças do Bispo Gelmires e dos Trava restaram vencidas pelas tropas de Afonso Henriques. Esta vitória retirou a D. Teresa e ao Conde de Trava a autoridade sobre o Condado Portucalense, passando o seu regimento ao Conde Afonso Henriques. Não cabe aqui falar em independência de Portugal porque nunca foi conquistado por rei nenhum, e a vassalagem prestada pelo Conde de Trava não podia ser aceita por não ser ele titular do direito. Havia um herdeiro varão, um sucessor direto, filho lídimo do Conde D. Henrique, a quem o Condado pertencia. Dom Afonso Henriques ficou em Zamora, por cinco anos, à espera de ver reconhecidos os seus direitos de herdeiro, por parte de sua mãe. Ao invés disso, foi jurada como herdeira a filha do Conde de Trava, o consorte de D. Teresa.


Creio que está fora de dúvida a prisão de D. Teresa em uma torre após ter perdido a batalha. Não se tratava de um filho rebelde contra a mãe, um filho desarrazoado, ou mera questão de desentendimento familiar, mas era questão de vida ou morte. O Conde de Trava não o deixaria vivo se fosse o vencedor, e D. Teresa não poderia garantir a vida do filho, pois a guerra fora contra si e os de Espanha. Havia uma necessidade imperiosa e urgente de confirmar a linhagem henriquina, contra a qual D. Teresa tomou armas. A Condessa tinha tomado o seu partido e sabia das consequências da guerra, tendo-a feito na certeza da vitória. Tinha ela plena consciência de que, obtendo a vitória naquele recontro, retirava ao filho todos os direitos ao Condado e à própria vida. Sabese que a convivência entre o Conde D. Henrique e a corte de Espanha era áspera desde o casamento; era tratado com desdém e desconfiança que degenerou em perseguição após a morte do rei. Os olhos do rei Afonso VI estavam postos nos filhos de suas filhas, os quais desejou para herdeiros. Pensou que podia obtê-los sem contradição alguma, ignorando a vontade dos genitores. Por esse estratagema, fazia importantes e grandes conquistas sem despesas, pacificamente, pois era o seu sangue. Seus dois primos - Raimundo, marido de Urraca, e Raimundo, marido de Elvira - amargavam suas diferenças, administrando o melhor que podiam as duras oposições e dificuldades. Raimundo, marido de Urraca, nunca teve autoridade em sua casa, dizendo-se dela que tivera uma filha fora do casamento por nome Sancha. Também teve um filho cujo pai era D. Gomez, Conde de Gormaz, grande senhor de Castela. O rei Afonso VI se sentiu tão ofendido que o pôs para fora do reino. À criança deram o nome de Furtado porque o parto foi às ocultas; dele provém os Furtados de Espanha. Já Raimundo de Elvira era considerado pelo rei Afonso VI um tolo perdulário que podia ser facilmente controlado, impondo a ele muitas restrições. Raimundo de Urraca morreu em 1107, deixando órfão o futuro rei Afonso VII, com dez anos. Raimundo de Elvira retirou-se da Espanha antes que sua convivência se deteriorasse e foi para a Palestina com todos os seus bens; lá construindo o Hospital Monte Peregrino, que deu origem à Ordem do Hospital. Urraca se tornara rainha em 1109 e casou com Afonso I de Aragão. Dom Henrique saiu a fazer guerra para que fosse jurado rei o filho de seu primo Raimundo, seu primo. Os nobres de Castela não queriam unir-se ao reino de Aragão e, juntamente com o Conde D. Henrique, defenderam o direito de Afonso VII, filho de Raimundo. Foi transitando neste ambiente que D. Teresa engendrou seu plano de afastar a linhagem de D. Henrique do Condado.


O trabalho de D. Teresa estava para ser coroado de pleno êxito ao fazer sua filha, de puro sangue espanhol, herdeira do Condado sem contradição alguma. O passo para a concretização do seu plano foi jurá-la herdeira na Corte de Espanha, quando lá foi prestar menagem. Abandonada pela fortuna, diante das tropas do seu filho, o caminho que lhe restou foi a prisão. Não creio que tenha havido protestos e maldições da parte dela porque estava consciente de ter entrado em uma disputa cuja sorte poderia lhe ser adversa. Perdendo a guerra, só havia duas opções: a morte ou a prisão, mas seu filho não levantou sua mão contra ela, permitindo que vivesse numa torre. Houve apenas restrição de liberdade. O Conde Afonso Henriques entrou vitorioso em Guimarães e confirmou sua linhagem para sempre.

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