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  • Glaucy Lucas

Afonso V - O Africano

Atualizado: 7 de mar. de 2019

Suas guerras e conquistas em África. Guerra dinástica contra Castela.

Cerco a Arzila: detalhe de uma das três tapeçarias que mandou Afonso V fazer em memória de suas conquistas em África. Inexplicavelmente estas tapeçarias desapareceram de Portugal no séc. XVI e só foram encontradas séculos depois na Espanha.

Tal como Jerusalém, Portugal está destinado a uma eterna existência. Jerusalém, porque é a capital do reino de Judá, de onde procede o grande Rei, a Raiz de David, que a tudo venceu e retomará o seu trono para reger as nações com vara de ferro. Portugal porque é o galho da Oliveira que floresceu e se tornou o vassalo fiel do grande Rei, Jesus. Em trezentos anos, este povo tão pequeno dá origem a um reino de uma pujança nunca vista, coisa inédita no mundo. Deus amou muito este povinho e o livrou da extinção. Castela sentia a dor de ter perdido a oportunidade de sufocar, matar à nascença a nação portuguesa, e anexar aquele pedaço de terra. Afonso VI de Castela tentou usar as fortes varas da oliveira ali plantada para o bem de seu povo, mas o plano eterno era a perpetuidade da existência de Portugal, o sangue de Abraão, Isaque e Jacó no lado ocidental do mundo. Não faltou a alguns a ambição, o desdém e a inveja para atentarem contra este reino vindo de Deus. No reinado de D. Afonso I todos lutaram pela glória da implantação do reino de Portugal, como membros de um só corpo, de uma só família, como um só homem. No reinado de D. João I todos lutaram pela nação, pela defesa do solo pátrio, pelos seus lares porque já havia uma identidade de filhos da nação. Já estava criada uma unidade espiritual indestrutível que os tornava portugueses. Todos tinham bebido a mesma bebida, comido o mesmo pão, pasmado dos mesmos terrores e animados da mesma esperança. Abrigaram-se das intempéries, choraram e festejaram as vitórias debaixo do mesmo pálio. O sangue do pai, as lágrimas da mãe caíram no mesmo solo; a terra recebeu os corpos dos que tombaram na luta; guardou os corpos dos que gastaram sua vida pela construção da pátria portuguesa. Na forja da guerra foram gerados e fortalecidos os filhos do Reino de Portugal. Mas, a mão de Castela ainda queria mexer os cordelinhos dos destinos de Portugal. Dom João I não era consenso geral porque o desejo de Castela era firmar a descendência de Inês de Castro, de origem castelhana, para melhor controlar e extinguir o reino de Portugal. O próprio rei de Castela se incumbiu de afastar do trono os filhos de Inês e D. Pedro I, ao mandar para a prisão o Infante D. João e deixar morrer D. Luís, o seu irmão.


Todos tinham bebido a mesma bebida, comido o mesmo pão, pasmado dos mesmos terrores e animados da mesma esperança. Abrigaram-se das intempéries, choraram, festejaram as vitórias debaixo do mesmo pálio.

As últimas vontades do rei D. Duarte dividiram o reino lançando-o em oito anos de disputas e dissensões até à maioridade do rei. Vivendo com sua mãe, a rainha D. Leonor, o pequeno rei deu ouvidos ao que diziam contra o Duque seu tio e culpou-o pelo sucedido à mãe. A rainha disse que ia para Castela por temer pela sua vida e lá morreu envenenada. Tanto Castela quanto os nobres portugueses partidários da rainha culpavam D. Pedro e exigiam do rei que lhe fizesse justiça. Como não pudesse se defender, o Duque de Coimbra carregou com todas as culpas que não devia. O desejo de vingar-se e o temor de perder sua autoridade cegaram o jovem rei e prejudicaram o seu reinado.

D. Afonso V não tinha ódio no seu coração mas agiu envenenado, sob o domínio das paixões que os inimigos do reino destilaram. O Duque de Bragança disfarçou bem a sua animosidade e despeito para com o rei, atirando às costas do Duque toda sua má obra. Desejou ele usar do rei enquanto criança para consecução dos seus objetivos, e estava ligado até à alma a seu sogro, o Condestável Nuno Álvares Pereira, que era insaciável de honras e reconhecimentos. Da mesma forma o Conde de Marialva se houve para com o rei, a demonstrar uma lealdade que não tinha, pois sempre esteve com o Duque de Bragança. Nuno Álvares Pereira intentou chegar ao trono por meio do Duque de Bragança, e com ele iniciar a sua dinastia. O Duque de Coimbra foi julgado e condenado, recaindo nele as culpas de todos os implicados. Alfarrobeira foi o seu cadafalso honrado para que o reino ficasse em paz. Dom Afonso V se ocupa das conquistas em terras africanas que, na verdade, são uma questão de honra.


O rei D. Afonso V passou sua infância em meio à tristeza do pai, murmurações dos nobres e ressentimento geral. Sentia a humilhação do rei seu pai e sua incapacidade de agir por ter a vontade real contrariada pelo poder do papa. O Sumo Pontífice enviara uma carta a requerer que não se desse Ceuta pela libertação do Infante D. Fernando, por ser de maior glória de Deus que assim ficasse. Não teve apreço à vida do Infante D. Fernando, filho de um rei que tudo fez pela fé cristã. Desde esse desastre, o clima familiar era tenso e sombrio e não mais houve alegria. Quantas vezes terá ouvido seu pai chorar e lamentar seu abandono, esmagado à sombra de seu pai, um rei em tudo vencedor! Da rainha sua mãe ouvia as lamúrias do quanto era perseguida, indesejada, desrespeitada, esbulhada dos seus pretensos direitos. Acompanhou-a nas suas fugas e presenciou suas cenas de medo do Duque de Coimbra, tido como usurpador do trono que defendia para o filho. Dom Afonso cresceu cultivando a necessidade de vingar a honra do rei seu pai. Era imperativo combater e submeter os povos que conspurcaram com tão grande opróbrio a casa de seu pai. Por outro lado, Dom Afonso não podia deixar sem resposta esse fato porque, perante os reis do mundo perdia força e respeito; os árabes cresceriam e se tornariam mais aguerridos, podendo tentar cometimentos maiores. O rei agiu corretamente, sem se deixar guiar pelo seu sentir, como menino traumatizado. O jovem rei mostrou sua madureza no preparo para a guerra, e sua força nas conquistas que obteve. Estes feitos confirmaram que havia um rei no trono de Portugal.

Dom Afonso vingou a honra de seu pai quantum satis na conquista de Alcácer Ceguer, Anafé, Arzila, Tânger e Laraxe. Restaurou o respeito de todos os reinos e recobrou sua autoridade real, que fora muito prejudicada. Ainda que injusta a guerra contra o Duque de Coimbra; ainda que os motivos tenham sido as difamações e intrigas; ainda que esta guerra tenha levado à extinção uma tão grande e nobre casa, um tio que tudo fez pelo bem do reino, pode-se considerá-la como um princípio de afirmação da autoridade real. Era o rei de Portugal e não o menino levado por paixões, cuja vontade podia ser dobrada ao alvedrio de qualquer nobre ou membro da família. Continuando suas conquistas, concedeu o monopólio do comércio da Guiné a Fernão Gomes da Mina, para que explorasse a costa, o que foi feito, chegando à Mina. Ali foi achado ouro com o qual o rei financiou suas conquistas.

O reinado de D. Afonso foi marcado pela necessidade de defender a dignidade, a honra e o respeito da casa real portuguesa. Este sentimento de honra, este desejo de ver sua casa gozar do respeito e acatamento que lhe era devido, não era algo fantasioso, inconsistente. As agressões à dignidade real prejudicavam o reino em todas os seus relacionamentos com os demais reinos do mundo. Se não vingasse a afronta de África, poderia ser sufocado por Castela e perderia seu assento de reino independente no mundo. Deixando de acudir sua irmã na afronta que sofria, expunha sua casa às mesmas afrontas, cujos males eram imprevisíveis. Henrique IV de Castela era acusado de ser homossexual, e por isso, foi posta em dúvida a legitimidade de D. Joana, a filha do dito rei. Por isso fez ele uma carta, que foi lida em cortes, transferindo o direito ao trono para sua irmã Isabel de Castela. Mas, estando no seu leito de morte, reconheceu a princesa Joana como sua filha legítima. Logo depois de sua morte, D. Joana foi esbulhada dos seus direitos ao trono por considerarem que era filha adulterina. A rainha D. Joana, sua mãe, foi difamada e sofreu um grave ultraje com violenta quebra de sua honra e dignidade sem que houvesse alguém que a defendesse. A princesa, sua filha foi alcunhada de Beltraneja por acharem que era filha de Beltran de La Cueva, um nobre que vivia na corte. Por ser a rainha D. Joana filha de D. Duarte, irmã do rei D. Afonso V, a afronta recaía sobre a casa de seu pai. Mesmo premido por estas circunstâncias, nada fez antes de consultar as cortes a ouvir e pesar todas as opiniões. Enquanto convocava cortes, recebia embaixadas dos nobres de Castela a suplicarem que fosse a Castela requerer seu direito ao trono. As casas mais fortes do reino de Castela apoiavam uma ação militar em favor de D. Afonso V, mas garantiram que todo o reino concordava em tê-lo por rei e senhor. Isabel de Castela era filha de João II de Castela e Isabel de Portugal, irmã de Afonso IV, e tinha em seu poder a carta que lhe dava direitos ao trono. Mas, consultada por D. Afonso V sobre suas intenções, disse que não queria usurpar o trono de D. Joana. Castela não queria Isabel no trono e pedia que D. Afonso V de Portugal casasse com sua sobrinha e reinasse em nome dela. Podemos entrever a prudência do rei ao externar sua intenção de lá ir para defender os direitos de sua sobrinha Dona Joana. Como os grandes do reino dessem todas as garantias de uma transição pacífica, D. Afonso V casou com sua sobrinha e foi à Castela com um pequeno exército, fazendo-se acompanhar de gente mais festiva. Ocuparia o trono até que D. Joana fosse aceita e pudesse reinar sem contradição. Mas foi surpreendido pelo ataque do exército de Isabel de Castela, sem contar com o auxílio das tropas dos nobres a ele favoráveis. Metade dos nobres e clero do reino estava com Isabel de Castela, que casou em segredo com Fernando de Aragão, juntando suas forças contra Dona Joana. Indo Dom Afonso V a uma cidade era recebido com festas e suas tropas se juntavam ao seu exército; outras estavam por Isabel de Castela. Porém, Dom Afonso V não sabia quais cidades estavam com Castela. Fernando de Aragão, com suas tropas unidas às de Castela, saiu ao combate na Batalha de Touro, e D. Afonso V foi obrigado a se retirar. Procurou apoio do rei Luís XI de França, mas foi traído, voltando para Portugal derrotado. Em 1479 assinou o Tratado de Alcáçovas-Toledo no qual D. Afonso e D. Joana desistiram de seus direitos ao trono de Castela para sempre. O mesmo Tratado foi ratificado em Toledo, terminando assim as guerras de sucessão de Castela.

Foi um duro golpe sofrido pelo rei que não o pôde suportar. Abdica em nome de seu filho D. João II e vai para o Convento de Varatojo em Torres Vedras, onde morreu em 1481. Nasceu em Sintra, em 1432; viveu 49 anos, dos quais reinou treze. Casou duas vezes, sendo a primeira com Isabel de Coimbra, filha de D. Pedro, Regente. Casou a segunda vez com Joana, filha de Henrique IV de Castela, a Excelente Senhora, e não teve geração. Com Isabel de Coimbra teve três filhos:

D. João, Príncipe de Portugal, que morreu ao nascer.

Santa Joana, princesa de Portugal;

D. João que foi rei.


Usou vários títulos conforme suas conquistas.

Na coroação: "Pela graça de Deus, Afonso V, rei de Portugal, e Algarve, e Senhor de Ceuta";

Em 1458: "Pela graça de Deus, Afonso V, rei de Portugal, Algarve, Senhor de Ceuta, e de Alcacer em África".

Em 1471: "Pela Graça de Deus, Afonso V, rei de Portugal, Algarve, d'aquém e d'além mar, em África".

Em 1475, pelo seu casamento com D. Joana: "Pela graça de Deus, Afonso V, rei de Portugal, Castela, Leão, Toledo, Galiza, Sevilha, Córdova, Jaen, Múrcia, Algarve, d'aquém e d'além mar, em África, de Gibraltar, Algeciras, e Senhor de Biscaia e Molina".


Mandou fazer as Tapeçarias de Pastrana para comemorar suas conquistas. São de grandes dimensões, feitas em seda e lã. Teve como tesoureiro a Isaac Abravanel, que era um financista judeu português.

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